Notícia
Estudo propõe nova metodologia para calcular montante de carbono sequestrado por florestas tropicais
Estimativas fiéis ao contexto tropical são fundamentais para o pleno funcionamento do mercado regulado de carbono, importante ferramenta para combater as mudanças climáticas
Divulgação, Unesp
Fonte
Jornal da Unesp
Data
sábado, 6 julho 2024 11:35
Áreas
Agronomia. Carbono. Ciência Ambiental. Engenharia Florestal. Geociências. Geografia. Mudanças Climáticas. Solo. Sustentabilidade. Tecnologias.
Os mercados de crédito de carbono surgiram no cenário internacional nas últimas décadas como um dos mais promissores instrumentos para mitigar a mudança climática causada pela emissão de gases do efeito estufa. Em sua essência, esse mercado articula diferentes atores e países de forma a possibilitar que as empresas que emitem carbono em suas atividades possam compensar essa emissão a partir da aquisição de créditos gerados por processos e atividades que capturem carbono, em quantidades equivalentes às liberadas pelas empresas. Nesta complexa equação, é essencial que haja uma metodologia certeira para estimar o carbono que é retirado da atmosfera e armazenado de diversas formas.
Hoje, as principais empresas certificadoras mundiais empregam praticamente a mesma metodologia, que é recomendada também pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), da ONU. Mas os autores de um novo estudo executaram variadas análises de diferentes perfis de fragmentos da Mata Atlântica e concluíram que essa abordagem ignora as particularidades dos solos que estão sob as florestas tropicais.
O resultado é que as avaliações que estão embasando as transações entre compradores e vendedores de créditos correspondem a apenas uma fração do montante de carbono que a floresta realmente captura.
Como remédio, os pesquisadores propuseram o aumento da profundidade da coleta da amostra e o uso de equipamento mais preciso para o cálculo do carbono no solo. Os resultados da pesquisa foram publicados na revista Scientific Reports.
É preciso ir mais fundo
Um dos pontos centrais da metodologia que é objeto de crítica por parte dos pesquisadores é a orientação por parte do IPCC para que a coleta de amostras alcance uma profundidade de, no mínimo, 30cm a partir do sol. No caso da metodologia aplicada pelas certificadoras, tornou-se padrão recolher apenas os sedimentos situados entre a superfície e os 30 cm de profundidade.
Os pesquisadores argumentaram que o material colhido até 30cm de profundidade não é suficiente para computar a quantidade de carbono no solo e sugerem a ampliação para um metro de profundidade. “A medida de 30cm é a mais fácil e adequada para a zona temperada, onde estão os países europeus e os Estados Unidos, porque os solos deles são mais jovens que os solos tropicais”, disse o Dr. Iraê Guerrini, engenheiro florestal e um dos autores do artigo.
“Por serem solos recentes, existem rochas próximas da superfície do solo que dificultam a coleta de amostras. Nesses ambientes, essas rochas ainda estão sofrendo ação de intemperismo, dos microrganismos e mesmo do sistema radicular das árvores. Esses fatores, ao longo de milhões de anos, transformam a rocha em solo”, apontou.
Método tem menor impacto ambiental
Outra proposta de melhoria na metodologia apontada pelos pesquisadores diz respeito ao método usado para quantificar o carbono na amostra. Atualmente, o mais utilizado é o método Walkley-Black, que determina o teor de matéria orgânica no solo por meio da oxidação da amostra com uso do dicromato de potássio. A crítica ao método é que, além de ser pouco preciso, envolve o uso de substâncias tóxicas que podem fazer mal à saúde humana e ao meio ambiente.
Em contraposição, os cientistas recomendaram o uso do Analisador Elementar (CHN Elemental Analyser). Ele pode fornecer resultados mais precisos porque detecta todas as formas de matéria orgânica presentes por meio da queima da amostra a altas temperaturas, além de ser mais seguro, apresentar resultados replicáveis e evitar o contato com produtos perigosos.
Por outro lado, explicou Iraê Guerrini, o custo do aparelho pode ser impeditivo: sua aquisição custa aproximadamente US$ 150 mil (cerca de R$ 820 mil), e o custo da análise pode ser até cinco vezes mais caro do que o método Walkley-Black. Para os autores, tal problema pode ser contornado por meio do estabelecimento de colaborações entre laboratórios e grupos de pesquisa bem equipados com parceiros em países com menor disponibilidade de recursos.
O trabalho analisou amostras de solo retiradas da fazenda experimental Lageado-Edgárdia, pertencente ao campus de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp), cuja área total é superior a 2.500 hectares e que inclui uma área de preservação ambiental. No local, foram escolhidos quatro perfis diferentes de florestas estacionais semideciduais de Mata Atlântica, que variavam de acordo com grau de regeneração e de interferência humana, além de um fragmento marcado pela transição entre Mata Atlântica e Cerrado, que também sofreu intensa supressão vegetal por desmatamento, pecuária e outras atividades antrópicas.
As amostras foram então analisadas e comparadas de acordo com a profundidade em que foram coletadas e o método de quantificação do carbono.
Quando comparados os dois métodos de análise, os resultados apontaram uma quantidade 40% maior de carbono com o uso do CHN Elemental Analyser, em comparação com o método Walkley-Black, sendo a maior diferença (de 99%), registrada nas amostras coletadas em fragmentos de floresta estacional semidecidual primária perturbada, uma formação caracterizada por distúrbios como extração de madeira e incêndios nos anos 80, mas onde não foram observadas alterações relevantes do uso do solo.
Acesse o artigo científico completo (em inglês).
Acesse a notícia completa na página do Jornal da Unesp.
Fonte: Marcos do Amaral Jorge, Jornal da Unesp. Imagem: Amostras recolhidas antes do processamento. Fonte: Divulgação, Unesp.
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