Estudo propõe critérios para ajudar a delimitar e conservar as áreas úmidas do Cerrado – ambiental t4h | Meio Ambiente, Saúde e Tecnologias

Notícia

Estudo propõe critérios para ajudar a delimitar e conservar as áreas úmidas do Cerrado

Áreas úmidas são também um extraordinário repositório de carbono, estocando mais de 200 toneladas por hectare

Dr. Rafael S. Oliveira

Fonte

Agência FAPESP

Data

quinta-feira, 8 dezembro 2022 10:20

Áreas

Biodiversidade. Biologia. Ciência Ambiental. Clima. Ecologia. Geociências. Geografia. Hidrologia. Monitoramento Ambiental. Políticas Públicas. Recursos Naturais. Saúde Ambiental. Sustentabilidade.

O Cerrado é o mais ameaçado dos grandes biomas do território brasileiro. E uma parte especialmente vulnerável do Cerrado são suas áreas úmidas, que garantem a existência de rios perenes e abastecem nada menos do que oito bacias hidrográficas. O Xingu, o Tocantins, o Araguaia, o São Francisco, o Parnaíba, o Jequitinhonha, o Paraná e o Paraguai, entre outros rios importantes, nascem no Cerrado. A destruição de áreas úmidas não ameaça apenas a biodiversidade e a extraordinária beleza das paisagens cerratenses. Põe em risco ainda a segurança hídrica e energética do país.

Além disso, as áreas úmidas são também um extraordinário repositório de carbono (C), estocando mais de 200 toneladas por hectare. E alterações em seu equilíbrio cíclico tendem a liberar metano (CH4) para a atmosfera, um dos principais gases de efeito estufa (GEE).

O problema é que a própria definição de áreas úmidas é confusa. E essa confusão tem sido explorada por grandes produtores rurais que, não contentes em converter descontroladamente áreas secas do Cerrado em terras agriculturáveis, cogitam também drenar as áreas úmidas, para estender as lavouras de soja até o fundo das veredas. Se não fosse por outros motivos, até mesmo do ponto de vista estrito do interesse econômico isso equivaleria a erguer uma pedra para deixá-la cair sobre os próprios pés, pois a possibilidade de irrigação depende da sobrevivência dos mananciais.

Para dirimir a confusão e fornecer aos tomadores de decisão sólidos critérios científicos, um grupo de pesquisadores acaba de produzir um artigo contemplando os múltiplos ecossistemas englobados pelo conceito de áreas úmidas. O estudo foi publicado na revista científica Perspectives in Ecology and Conservation.

“A falta de definições precisas tem embaralhado a regulamentação, deixando importantes segmentos do Cerrado desprotegidos. Nosso objetivo foi esclarecer o que são áreas úmidas; que ecossistemas podem ser abarcados por esse nome; que dinâmicas eles apresentam; e o que devemos fazer para protegê-los”, disse à Agência FAPESP a pesquisadora Dra. Giselda Durigan, primeira autora do artigo.

A Dra. Giselda Durigan é pesquisadora do Instituto de Pesquisas Ambientais do Estado de São Paulo (IPA) e professora nos programas de pós-graduação da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Estuda o Cerrado há mais de 35 anos.

“Um exemplo do grave risco que a falta de definições precisas e as ambiguidades na interpretação da lei podem acarretar foi a Resolução número 45, de 31 de agosto de 2022, aprovada pelo Conselho do Meio Ambiente de Mato Grosso (Consema). Desrespeitando decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), essa norma regulamentou o ‘licenciamento ambiental de atividades e empreendimentos localizados em áreas úmidas’ no âmbito estadual. Por trás dos eufemismos do texto, a resolução, de fato, libera a destruição”, denunciou a professora Durigan.

A pesquisadora define: “Áreas úmidas são porções de terras continentais que estão sujeitas, periódica ou permanentemente, a encharcamento do solo ou inundação. Dada a sua fragilidade e extrema importância para o armazenamento e a filtragem da água, são globalmente protegidas, desde a convenção intergovernamental realizada em Ramsar, no Irã, em 1971. O Brasil é signatário da convenção de Ramsar desde 1996, mas até hoje não atendeu ao compromisso de mapear todas as suas áreas úmidas”.

No país, há exemplos de áreas úmidas em faixas costeiras, onde os pulsos de inundação resultam da oscilação das marés, de modo que a água se apresenta salgada ou salobra. E também longe da costa, compondo dois grandes tipos, hidrologicamente distintos: terras que são periodicamente alagadas pelo transbordamento dos leitos dos rios (várzeas e pantanais) e terras que ficam encharcadas ou até alagadas pela elevação periódica do lençol freático.

“As áreas úmidas do Cerrado geralmente se enquadram no último tipo. As chuvas abundantes, que caem nos meses de verão, infiltram-se lenta e profundamente no solo, recarregando o lençol freático e acumulando-se nas áreas úmidas, de onde brotam os pequenos riachos que nunca secam e alimentam os grandes rios do Brasil, mesmo nos períodos de estiagem. Diferentemente, aliás, das outras grandes savanas do mundo, cujos grandes rios secam de todo durante boa parte do ano”, explicou a professora Giselda Durigan.

Boa notícia

A boa notícia é que existe, no momento, um grande grupo de técnicos e cientistas, representativos de diferentes regiões do Brasil, empenhados em realizar o Inventário Nacional de Áreas Úmidas, sob a liderança dos especialistas Dr. Wolfgang Junk e Dra. Cátia Nunes da Cunha, do INCT Áreas Úmidas (Inau), para dar suporte ao Ministério do Meio Ambiente.

“A Plataforma MapBiomas incluiu recentemente a legenda ‘Áreas Úmidas’ em seus mapas, o que constitui em grande avanço. Porém, demarcar as áreas úmidas em campo, na escala de uma propriedade rural, não é uma tarefa fácil e isso atrapalha a aplicação das leis. Nosso artigo propõe critérios objetivos, baseados no solo hidromórfico, na flora endêmica e na elevação máxima do lençol freático para facilitar a delimitação de áreas úmidas em escala local”, concluiu a professora Giselda Durigan.

Acesse o artigo científico completo (em inglês).

Acesse a notícia completa na página da Agência FAPESP.

Fonte: José Tadeu Arantes, Agência FAPESP. Imagem: Chuveirinho (Paepalanthus urbanianus) em campo úmido na Chapada dos Veadeiros, em Goiás. Fonte: Dr. Rafael S. Oliveira.

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