Notícia

Onde a ciência e o saber popular se encontram

Pesquisadora mergulha nos relatórios das expedições científicas do Prof. Abreu Matos e descobre informações inéditas sobre o uso popular de plantas medicinais da caatinga

Divulgação

Fonte

Agência UFC | Universidade Federal do Ceará

Data

segunda-feira, 3 junho 2019 13:10

Áreas

Ciência Ambiental, Conhecimento Tradicional, Saúde.

“A planta do lugar para o povo daquele lugar.” Com esse lema, o Prof. Francisco José de Abreu Matos (1924-2008), idealizador do Programa Farmácias Vivas, pautou toda sua carreira científica. Atravessando gerações, o valor da pesquisa desenvolvida por ele continua a ser redescoberto mesmo após sua morte, como agora em que a importância de seu acervo ganha um novo capítulo. Um grupo de pesquisadores, liderado por Karla Magalhães, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Inovação Tecnológica de Medicamentos da Universidade Federal do Ceará, acaba de ter um artigo publicado no importante periódico holandês Journal of Ethnopharmacology (periódico de Qualis A1 pela classificação da CAPES) sobre os registros das viagens científicas do Prof. Matos.

Através do resgate e análise dos dados de expedições etnobotânicas (saberes locais sobre as plantas e seus usos) realizadas entre 1980 e 1990 por Matos e o inseparável companheiro, o botânico Afrânio Fernandes, da UFC, a tese apresenta um compêndio de documentações populares e dos conhecimentos tradicionais associados (material até então inédito) contendo as informações botânicas, fitoquímicas e etnofarmacológicas. De acordo com Karla, a partir do mergulho nos relatórios de viagens, é possível perceber que o professor utilizava técnicas de análise etnobotânica quantitativa sobre as plantas medicinais mesmo quando essas práticas ainda eram muito incipientes no Brasil.

“O que nos surpreendeu foi o fato de que, apesar de o Prof. Matos não ter alcançado tais técnicas, ele as aplicava de forma intuitiva, e várias das indicações por ele anotadas foram sendo comprovadas em ensaios farmacológicos ao longo dos últimos 30 anos”, revela Karla. O ineditismo do trabalho se deve à aplicação dessas técnicas a um acervo pessoal, com o objetivo de analisar as informações anotadas pelo professor. Além disso, a tese sugere algumas plantas medicinais da caatinga com potencial de bioprospecção farmacêutica.

RECLASSIFICAÇÃO

O primeiro passo para a aplicação das técnicas foi a revisão da nomenclatura botânica das plantas pelo sistema APG (do inglês, Angiosperm Philogeny Group), moderno sistema de classificação das plantas com flor, atualmente em sua quarta versão. “Pegamos o acervo, catalogamos, organizamos isso de forma cronológica e passamos a checar a classificação. E começamos a verificar se essas plantas, depois de avaliadas geneticamente, mudaram de nome”, detalha.

A aroeira, por exemplo, planta medicinal usada popularmente para tratar inflamações e a mais citada para o tratamento de doença no acervo de Matos, sofreu uma alteração de nomenclatura: passou de Astronium urundeuva para Myracrodruon urundeuva. Isso porque a classificação botânica se relacionava apenas a características como a forma das folhas e a existência de frutos. A partir da APG, houve um mapeamento genético que resultou na reclassificação. No acervo do Prof. Matos, das 272 espécies, 84 foram reclassificadas.

O clado filogenético (grupo de organismos originados de um único ancestral comum exclusivo) tem como base os chamados marcadores fitoquímicos (compostos de natureza química produzidos por vegetais). No caso da Myracrodruon urundeuva, sabe-se que é conhecida por conter chalconas e taninos, substâncias com atividades farmacológicas já comprovadas. Isso a enquadra em um clado específico. A partir daí, são aplicadas técnicas estatísticas e de análise etnobotânica quantitativa que conferem valor científico àquela informação popular anotada.

“A pessoa diz que usa para inflamação de mulher. Então, eu tenho de classificar na categoria de uso ‘problemas ginecológicos’. Essa informação será avaliada de acordo com informações fitoquímicas do clado filogenético em que a M. urundeuva está classificada. Por que isso me valida cientificamente a informação popular? Porque, através desse cálculo, eu posso dizer o seguinte: se eu tenho uma forte indicação de uso de Myracrodruon urundeuva, que está no clado A, para problemas ginecológicos e já é conhecido que chalcona tem atividade anti-inflamatória, eu confiro valor científico a essa informação popular”, descreve.

Acesse o conteúdo completo na página da Agência UFC.

Fonte: Karla Magalhães, do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Inovação Tecnológica de Medicamentos da UFC.

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